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21 de fevereiro de 2011

Mercearia XI - Vida no "planalto" de Alvalade (3)

Contornando a esquina, e entrando na Avenida da Igreja, encontrei um novo local de interesse. Embora o interior desta mercearia, também com cerca de 50 anos, tenha sido completamente renovado, a verdade é que continua a ter algo de diferente.

Ao fim de 3 mercearias visitadas em Alvalade, importa salientar a importância desta zona permanecer verdadeiramente activa. Ao contrário de outras zonas de Lisboa, aqui, quem se sentar nos bancos, por exemplo, na Avenida da Igreja, pode ver miúdos e graúdos a sair de suas casas, a fazer uma primeira paragem na casa de frangos, uma segunda na mercearia, e uma terceira na farmácia, antes de desaparecem do alcance ou de entrarem em transportes públicos (que por aqui também não faltam). Pode parecer um pequeno pormenor, mas faz toda a diferença e mantém viva e bonita esta zona de Lisboa. Tudo funciona numa harmonia perfeita para a qual o próprio Mcdonald's dá o seu contributo, com uma movimentação que injecta vida e calor humano nos negócios contíguos.

E é neste ambiente, de algo que foi grandioso, que soube reinventar-se, e continua a sê-lo, que surge esta mercearia. Típica na sua modernidade reinventada, numa zona que se recusa a envelhecer.

Avenida da Igreja 8A




18 de fevereiro de 2011

Mercearia X - Vida no "planalto" de Alvalade (2) - Não há fome que não dê em fartura

Ainda no planalto de Alvalade, não tive de andar muitos metros para chegar à mercearia seguinte. Posso mesmo dizer que não necessitei de andar muitos decímetros (unidade de medida tão desprezada). Por incrível que pareça, esta mercearia encontra-se no número seguinte na mesma rua.

Imbuído por este espírito de economia de passos, desloquei-me ao seu interior para encontrar um espaço completamente distinto do primeiro. Bastante menos largo, mas completamente atestado de artigos, até ao tecto.

Apesar da concorrência, esta mercearia, também perto dos 50 anos, parece ter clientes suficientes para justificar tamanha proximidade.

A dona deste espaço, com uma inegável simpatia e curiosidade pediu-me apenas que não a fotografasse. Assim o fiz, mas "vinguei-me" na fruta.

Rua Luís Augusto Palmeirim 1E




15 de fevereiro de 2011

Mercearia IX - Vida no "planalto" de Alvalade (1)

Se é verdade que Lisboa é a cidade das colinas, não é menos verdade que também existem vários bairros desta cidade onde podemos deixar um saco de laranjas cair ao chão sem que estas percorram quilómetros em direcção ao rio. Um destes locais, maus para laranjas com síndrome viajante/navegador, é Alvalade.

Esta zona, para além de ser bastante bonita e gozar de uma aparente limpeza pouco vista noutros locais, tem também uma vida muito activa e característica. As ruas estão cheias de pessoas que inundam as lojas que inundam, novamente, as ruas. Existem inúmeros negócios, muitos até mais renovados do que esperava, para todos os gostos e feitios. Desde casas de chá, a restaurantes (tradicionais, nipónicos, nepaleses…), mercearias, casas de restauro de móveis... colocando de lado qualquer vontade de ir até a um centro comercial por falta de oferta do comércio local. E por enquanto estou só a falar da Avenida da Igreja e de duas das suas paralelas.

Foi envolto neste ambiente, totalmente anti-crise, que encontrei uma das maiores mercearias onde já entrei. Para além de ocupar dois números, prolongava-se numa imensidão de metros quadrados, rematados com diversos pilaretes. Os donos, de grande simpatia, estiveram sempre a atender clientes, novos e habituais, que por ali se foram abastecendo. Embora este fluxo não me tenha permitido falar tanto com os donos, a verdade é que me deu algum conforto sentir que estava num sítio que amanhã, depois de amanhã ou daqui a mais 52 anos ainda por cá estará.

Rua Luís Augusto Palmeirim 1B/C






10 de fevereiro de 2011

Mercearia VIII - Ao longo da Penha (3)

Insistindo no serpentear da colina da Penha de França, deparei-me com mais um espaço que não dava para ignorar. Todos as pistas gritavam bem alto "Sou o teu tipo de mercearia". A carrinha antiga, de cor bege, com vários produtos, o porta-bagagens com cordas verdes e vermelhas a tombar do interior, vários caixotes vazios empilhados a um canto e um senhor, de ar simpático e bem disposto, com as mãos cruzadas sobre a barriga numa performance de convite irrecusável.

Bem mandado, lá fui eu e acabei por passar bastante tempo à conversa. Esta mercearia, porventura uma das mais pequenas onde já entrei, encontra-se numa esquina a meio de uma rua que, embora íngreme, apresenta uma grande movimentação de pessoas e veículos. Enquanto lá estive cruzei-me com diversos clientes, de diversas faixas etárias e até pais e mães com filhos pequenos. Creio que desde o início destas caminhadas foi a primeira vez que vi pessoas com menos de 15 anos nestes espaços.

Embora o movimento já não seja o de antigamente, fui informado de uma iniciativa da Junta de Freguesia da Penha de França, para promover o comércio local e apoiar as famílias carenciadas, neste último Natal, que me pareceu um indicador positivo no combate ao esquecimento desta zona.

Aqui há vida!

Rua Mestre António Martins 7




5 de fevereiro de 2011

Mercearia VII - O segredo da cidade

Existe um segredo em Lisboa. Todos os que por cá vivem conhecem-no implicitamente; os que cá não vivem, também o conhecem, até porque muitas vezes é a primeira coisa que a cidade dá a conhecer. "Sou uma cidade com colinas".

É certo que agora mereço ouvir um sonoro "que novidade!". Mas o que significa na verdade ser uma cidade com colinas?

Significa que existem várias porções da cidade, que em muito poucos metros apresentam morfologias muito distintas. E diferentes morfologias, criam ruas únicas, atípicas e até contrastantes (mesmo quando distam poucos metros). O facto de ser uma cidade com colinas significa ainda que é muito fácil passarmos sempre pelos mesmos caminhos sem fazer grandes experiências (a lei do menor esforço entra compreensivelmente em acção). Se existem 3 caminhos e dois deles desafiam o limiar da aderência das solas de borracha, nem falemos dos saltos, e com uma calçada mais polida do que um ringue de gelo, é óbvio que em 99% das vezes vamos seguir pelo terceiro caminho. Mas é justamente essa característica que faz com que seja possível, numa cidade de modestas dimensões, existir sempre uma surpresa, um metro de rua por onde não andámos, uma pedra da calçada onde nunca tropeçámos, um portão, um ferro ou um prédio que nos fascina e apaixona.

Esta mercearia pertence a uma rua que para mim encarna perfeitamente este exemplo. No seu interior encontrei três pessoas: o dono, com a sua bata azul, a dona e um cliente habitual. Todos se dispuseram a ser fotografados, contaram histórias e até sugeriram outros locais de interesse. É caso para dizer que nesta rua a simpatia é como as cebolas. Está à vista de todos!

Rua Capitão Renato Baptista 29C




2 de fevereiro de 2011

Mercearia VI - Ao longo da Penha (2)

Continuando pelas ruas íngremes desta colina, supostamente a mais alta de Lisboa, descobri mais um espaço que me fez entrar. Desta vez foi o chão que me chamou à atenção como se me dissesse, com um olhar guloso, "Pst, olha lá, então não era a mim que me querias?" E era mesmo!

Após uma interessante conversa com o dono fiquei a saber que este espaço existe como seu há mais de 20 anos mas que já antes disso funcionara como mercearia. Relatou-me também a sua aventura por terras de Vera Cruz, com um sotaque que a espaços nos confirma isso mesmo, onde viu muitas mercearias e supermercados a fechar em alturas menos boas.

Para já espera que a situação financeira por cá melhore para que possa manter este espaço onde, com simpatia, tem sempre dois dedos de conversa para partilhar com os seus fregueses.

Rua da Penha de França 220B